Cacique Merong é enterrado em Brumadinho mesmo com decisão contrária da Justiça

Cacique Merong é enterrado em Brumadinho mesmo com decisão contrária da Justiça
Cacique foi encontrado morto nesta segunda-feira (4 de março) — Foto: Reprodução/Redes sociais
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PF alegou à Justiça que impedir sepultamento podia gerar conflitos no local

O tempo   Por Lucas Gomes

 

A Vale tentou impedir judicialmente que o cacique Merong Kamakã, encontrado morto na última segunda-feira (4), em Brumadinho, na aldeia onde vivia, fosse enterrado nas terras do Vale do Córrego de Areias, que são alvo de disputa entre a empresa e o grupo de indígenas liderado por ele. Apesar de a mineradora ter conseguido liminar deferindo que o sepultamento não poderia ocorrer lá, o líder indígena foi enterrado na área, na madrugada desta quarta-feira (6).  

A juíza Geneviève Grossi Orsi, da 8ª Vara Federal Cível de Belo Horizonte, determinou que Polícia Federal e Polícia Militar empenhassem o auxílio de força para adotarem as medidas necessárias para impedir o sepultamento, inclusive autorizando a intervenção policial. A Polícia Federal, no entanto, teve ressalvas quanto a decisão. Conforme documento obtido pela reportagem de O Tempo, a Superintendência da Polícia Federal de Minas Gerais recebeu com “muita preocupação” a decisão da Justiça. A PF alegou que a medida “prejudicava o planejamento operacional adequado, uma vez que não foi possível dimensionar sequer a quantidade de indígenas que poderiam estar presentes no evento”. Além disso, foi pontuado que “o cumprimento da medida poderia ocasionar graves conflitos, uma vez que se trata de um líder indígena cuja morte gerou uma grande comoção na comunidade indígena, tendo repercutido, inclusive, nos principais veículos nacionais de comunicação”. Em vez de cumprir a decisão, a PF decidiu acionar o plantão judiciário para “analisar e deliberar” os riscos. 

Era mais de 3h da madrugada desta quarta-feira quando o juiz federal plantonista Flávio da Silva Andrade avaliou o pedido da PF. O magistrado pontuou que apesar de as ponderações serem relevantes, não era “o caso de suspender o cumprimento da ordem judicial já proferida pelo juízo competente”. “Há de se viabilizar o auxílio de força policial ao Sr. Oficial de Justiça, a quem cabe dirigir-se ao local, averiguar a situação e, confirmando o cenário acima imaginado, reportar os fatos ao juízo natural, a quem competirá decidir a respeito na manhã, no início do expediente. A PF poderá enviar o número de agentes que for possível nas circunstâncias, buscando cooperação com a PMMG, que possui homens naquela região. Reafirmo que caberá ao Oficial de Justiça a analisar as circunstâncias no lugar e dar conhecimento daquilo que apurar à magistrada prolatora da decisão de que se trata”, decidiu. 

 As polícias citadas receberam a intimação por volta de 7h, quando o cacique já tinha sido enterrado. Procurado pela reportagem, o advogado da Vale, Luiz Philipe Nardy Nascimento disse que não comenta decisão judicial, que só vai se manifestar no processo, mas que tem ciência da realização do sepultamento. A mineradora não respondeu aos questionamentos feitos pela reportagem. 

Em contato com a reportagem, a advogada Lethícia Reis, que representa o cacique no processo, alegou que a comunidade não foi intimada da decisão da Justiça e que, por isso, ocorreu o sepultamento. Ela entende que após a realização da cerimônia, a decisão perde o objeto, ou seja, não tem sentido. "Se a Vale entrar com pedido de remoção do corpo, isso vai ser analisado pela Justiça. O que posso dizer agora é que a decisão dada impedia o sepultamento, não trata de exumação. Caso isso ocorra, tem que ser por outra decisão", avaliou.

Procurada, a Polícia Federal disse à reportagem que "antevendo a situação, as equipes já estavam mobilizadas desde 0h desta quarta-feira" e que a decisão judicial chegou à PF na manhã desta quarta. "Recebemos a demanda e cumprimos imediatamente com o nosso dever de resguardar o cumprimento da ordem judicial, que é feito pelo oficial de Justiça", afirmou.