Anel Rodoviário mata uma pessoa a cada 16 dias em média

Anel Rodoviário mata uma pessoa a cada 16 dias em média
Em 2023, a obsolescência da via tirou a vida de pedestre e motorista de carro, após atropelamento seguido por batida no Bairro Universitário
Receba as notícias do MCM Notícias MG no Whatsapp
Receba as notícias do MCM Notícias MG no Whatsapp
Receba as notícias do MCM Notícias MG no Whatsapp

Corredor viário de BH, que abre série de reportagens do Estado de Minas, foi palco de 191 óbitos no trânsito nos últimos 10 anos, segundo o Observatório de Segurança

 

Gabriel Ronan Estado de Minas 

Alta velocidade e pé no freio; declives e aclives; abertura e recolhimento constante de pistas; e uma mistura entre carros de passeio, motocicletas e veículos de carga dividindo o mesmo espaço. Quem vive na Região Metropolitana de Belo Horizonte não precisa ter muita experiência “no trecho” para relacionar a descrição ao Anel Rodoviário. A via urbana que mais registra acidentes em Minas Gerais abre a série especial Risco sobre Rodas do Núcleo de Dados do Estado de Minas, que vai mostrar em números, relatos de personagens e análises de especialistas, os motivos que levaram a capital mineira a perder 1.372 vidas no trânsito nos últimos 10 anos, uma a cada três dias em média, considerando o balanço até abril deste ano.

No caso do Anel, a combinação entre a falta de obras e a imprudência de condutores e pedestres resulta em uma vida perdida a cada 16 dias em média desde 2014, conforme números do Observatório de Segurança Pública de Minas Gerais, segmentados pela reportagem. A rodovia tirou a vida de 230 pessoas no período, entre elas nove entre 12 e 17 anos.

Esse total de 230 mortes é quase o quádruplo da segunda via mais fatal do ranking belo-horizontino, a Avenida Cristiano Machado, que soma 63 óbitos desde 2014. Só neste ano, até abril, os 27 quilômetros de extensão do Anel foram palco de 14 vidas perdidas no trânsito – também o maior número entre todos os corredores de Minas Gerais. O dado, em proporção, é maior que o registrado pela série histórica iniciada há 10 anos, já que representa uma vida perdida no Anel Rodoviário a cada 8 dias em média. Ainda no recorte temporal mais recente, um trecho de apenas cinco quilômetros, entre os encontros com a BR-040 e a Avenida Presidente Carlos Luz, concentra sete pontos com acidentes fatais nos últimos três anos.

Um trecho de cinco quilômetros do Anel Rodoviário, entre os encontros com a BR-040 e a Avenida Presidente Carlos Luz, concentra sete pontos com acidentes fatais nos últimos três anos, como mostra o mapa abaixo:
Os números históricos mostram que a condição principal para as mortes no Anel Rodoviário passa pelo atropelamento de pessoas. Das 230 mortes registradas desde 2014, 96 (41,7%) aconteceram dessa maneira. No último dia 6, um homem de 52 anos perdeu a vida exatamente desse jeito. Ao tentar atravessar a rodovia na altura do Bairro Estrela do Oriente, na Região Oeste de BH, um caminhão o atingiu durante o período da noite.

O motorista do veículo de carga contou à polícia que dirigia no sentido Vitória, na altura do Km 539, onde a vítima cruzou a via de maneira repentina. Uma equipe da concessionária Via 040 constatou a morte.

Não é só nas mortes que o Anel tem a liderança histórica em Minas Gerais. Desde 2014, o Observatório de Segurança Pública registra 677 acidentes graves no corredor rodoviário, que se tornou uma avenida de alta velocidade com a expansão da população da Região Metropolitana de Belo Horizonte (leia mais nas páginas seguintes). Esse dado representa uma ocorrência com ferido grave a cada cinco dias no local.

Em números gerais de acidentes, sem considerar a gravidade, a liderança em BH também é do Anel. São 31.649 registros no período, o que representa 8,4 por dia, ou um a cada três horas. Esse consolidado considera também ocorrências em trechos da BR-381 na capital. A rodovia integra o Anel Rodoviário na cidade, mas, por efeito de registro, as autoridades, em casos isolados, localizam os fatos na Fernão Dias, em vez de referenciar o termo “Anel Rodoviário”, o que causa diferenças na base de dados.

Além do Anel Rodoviário, a série de reportagens do EM vai detalhar números, trazer relatos e problematizar os históricos de outros quatro corredores de BH, que, em ordem, registram os maiores números de acidentes gerais da cidade. Tratam-se das avenidas Cristiano Machado, do Contorno, Amazonas e Antônio Carlos. Somadas ao Anel, as cinco vias computam 115 mil ocorrências de trânsito nos últimos 10 anos, além de 444 mortes no período. O total de fatos graves nas cinco chega a 1,8 mil no mesmo intervalo de tempo.

Apesar dos números trazerem um quadro fiel ao que acontece nas ruas, avenidas e rodovias de BH, ainda são frágeis em alguns aspectos. Dos 763.571 acidentes computados na cidade, em boa parte as autoridades não especificaram informações importantes para a formulação de políticas públicas. As condições de iluminação (dia, tarde ou noite), por exemplo, só são especificadas em 15% dos registros. A qualidade da sinalização, ao mesmo tempo, só aparece em 14,3% das anotações. O tipo de pista (simples, dupla ou múltipla) só consta em 14,6% dos boletins.

Para o professor de educação e segurança no trânsito do Cefet-MG, Agmar Bento Teodoro, a ausência desses dados compromete a formulação de soluções para o problema histórico de insegurança do Anel. "Na academia, para desenvolver pesquisas, é uma briga nossa para conseguir esses dados em primeiro lugar. Depois, o desafio é que eles sejam melhor apurados. Já fizemos vários trabalhos científicos e parcerias com a BHTrans para tentar melhorar a estrutura desses números, mas não houve tanto avanço”, afirma.