Dia Nacional do Livro: dedicatórias ajudam a contar histórias e marcas dão vida às obras
Livros da Atena Bookstore e Quarup servem como presente ou memória; obras oferecem ao leitor oportunidade de vivenciar livros
Tribuna Por Elisabetta Mazocoli
Entrar em sebos ou livrarias antiquárias, como alguns gostam de chamar, é se deparar com um mar de histórias. Elas estão nas páginas dos livros, que aparecem com diferentes edições e percorrem décadas com sua relevância, mas também nos detalhes que os compõem, e que só podem ser achados nesses espaços. Os mais atentos podem encontrar obras com dedicatórias e que exibem essas marcas do tempo, como mais uma camada das histórias que estão sendo contadas, trazendo nas próprias páginas a história de quem leu, de quem deu de presente um livro ou em quem se pensava enquanto lia. Há ainda aquelas verdadeiras jóias, com assinaturas de grandes escritores, como Drummond, Ferreira Gullar e Affonso Romano Sant’Anna, que de repente podem aparecer para quem procurar no Centro ou em São Mateus, em Juiz de Fora. Esses mesmos livros também podem guardar fotos, desenhos ou mesmo confissões dos leitores. No Dia Nacional do Livro, celebrar esse objeto é também reforçar as potencialidades que ele tem, enquanto presente ou memória.
Na Atena Bookstore, há quem reconheça essa força e vá procurar livros mesmo por conta das dedicatórias. Antes, a dupla Poliana Oliveira e Paulo Roberto Almeida, no processo de cuidar dos livros e deixá-los próprios para as vendas, retiravam os artefatos mais pessoais. Com o tempo, no entanto, perceberam que aquilo era um grande atrativo.
“Quando a gente compra um acervo e movimenta os livros, a gente vai se surpreendendo. Eu sempre posto nas redes e as pessoas se encantam. Já encontramos dedicatórias, cartas, fotografias”, relembra Poliana. Ela mesma confessa que já se interessou por um livro pela dedicatória que carregava, que deixava a história mais atrativa. “O livro usado tem a história dele e outras histórias, também. Às vezes, já passou por três gerações de donos, todos de um tempo diferente, e cada um faz suas interefências.”
Essas dedicatórias, muitas vezes, são feitas pelos próprios escritores para seus leitores – mas também acontece o processo contrário. Como explica Cláudio Luiz da Silva, da Quarup, há muitas obras com um valor acrescentado dependendo de para quem foi dedicada. Livros enviados para o maior bibliófilo do Brasil ou para personalidades importantes, por exemplo, costumam atrair olhares. “Qualquer sebo e livraria antiquária aonde você for vai se deparar com produtos autografados e livros com dedicatórias. As pessoas montam, compram e vendem bibliotecas. (…). A gente vai selecionando esse material pelo que há de história nele”, explica.
Já há 25 anos ele mantém a Quarup, e vai vendo esses livros tomando novos leitores, de diferentes gerações. “O fator fundamental é a surpresa. Em uma livraria de livros novos, é tudo muito previsível, é aquilo que está em catálogo e os últimos lançamentos das editoras. No sebo, não. Temos livros de 1700 e de 2023. É uma trajetória caminhante”, conta.
Livro com dedicatória em francês e desenho é um dos que compõem acervo da Atena (Foto: Leonardo Costa)
‘De um leitor do passado para um leitor do futuro’
“Ao meu amigo João Carlos do futuro, com um abraço do João Carlos do passado. Salve 30 de outubro de 84′ (Foto: Leonardo Costa)
Para se escrever uma dedicatória, quando se dá um livro de presente, é interessante contar porque o presente está sendo destinado e o que se espera com aquela história chegando ao outro. Na percepção de Paulo, essas dedicatórias costumam ser feitas mais em livros de literatura brasileira ou de poesia, em que o lírico toma força. Mas, é claro, há as vivências nos livros que são mais misteriosas, que não se sabe bem se foi o acaso que provocou e para quem se destinava. É o caso dos que carregam desenhos e fotos, por exemplo.
Transportar essas narrativas também promove uma verdadeira viagem no tempo, e podem fazer com que os novos leitores consigam imaginar formas de se empoderar daquele livro de outra forma enquanto leem – até com marcações ou grifos. “Essas histórias precisavam ser repassadas, e novos leitores podem ressignificá-las. Os novos leitores vão ter esse contato e trazer suas histórias também. De um leitor do passado pra um leitor do futuro”, conta Paulo.
O encontro
Livros podem guardar até pequenas fotos de família ou santinhos, com mensagens nada óbvias (Foto: Leonardo Costa)
Abrir cada livro nesses espaços, então, se torna uma descoberta nova. Às vezes, é um reencontro, às vezes, uma ressignificação e, ainda, há quem se inspire. “Às vezes, a pessoa se depara com uma edição especial, vê as histórias ali. As histórias são sempre mais importantes que os produtos”, conta Claudio. Para ele, para encontrar essas delicadezas, é importante estar atento – e não necessariamente só procurando. Manter essa tradição das dedicatórias e de pegar autógrafos com os escritores faz com que os livros sejam vivenciados por completo, num processo que nunca acaba. “As pessoas encontram esses livros caminhando até os antiquários e sebos. É uma busca de certa forma constante. (…) E tem o acaso. A gente descobre muita coisa vivendo, tendo um olhar diferente pra cidade e pra região onde mora”, diz.
“Kadu, que sejam amorosos seus dias mais comuns!” (Foto: Leonardo Costa)
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