‘Café com leite’ vai ser apresentada no Festival de Curitiba
Peça juiz-forana, escrita por Rafael Coutinho, é encenada nesta quarta para angariar fundos para a viagem
Tribuna Por Cecília Itaborahy
O Festival de Teatro de Curitiba, considerado um dos maiores do Brasil, acontece no fim deste mês. A capital do Paraná, do dia 25 ao dia 7 de abril, se transforma em um grande palco, que recebe as principais peças de todo o Brasil. E Juiz de Fora, neste ano, vai ser representada. O espetáculo “Café com leite”, do diretor Rafael Coutinho, participa desta edição, dentro da Mostra Minas, junto com duas outras peças mineiras. Para angariar fundos para a viagem, a peça juiz-forana vai ser apresentada nesta quarta-feira (6), no Teatro Paschoal Carlos Magno, a partir das 20h. Os ingressos podem ser adquiridos no link com preços promocionais.
Rafael está no teatro há 20 anos. Seu primeiro contato com essa arte aconteceu ainda dentro da escola. Ao mesmo tempo que se interessava pela área, se via também dentro do mundo das letras que, anos tempos, viraria sua profissão. Já naquele momento, percebeu que era isso que queria fazer na sua vida. Uma coisa levou a outra e escrever peças entrou na sua mira. “Eu pulei da escrita para a direção, o que é um desafio, porque, para dirigir, o autor tem que estar morto. Então, eu tive que me matar um cadinho para dirigir ali a peça”, brinca.
Essa relação entre teatro e as letras, de certa forma, moldou seu olhar, exatamente por esse apreço pela linguagem. “A gente tem muito uma preocupação de entregar uma narrativa. Tanto que isso me preocupa muito: a comunicabilidade no teatro. Porque outras vertentes estão mais preocupadas com o trabalho do corpo. Não que eu não tenha. Mas é uma coisa mais interna. Mas essa vertente mais próxima do literário, essa coisa da comunicação, é muito cara para mim e eu tento preservar.”
Seu olhar aguçado para a narrativa e as referência que carrega sobretudo de Sylvia Ortho, escritora brasileira, foram fundamentais para as peças que escreveria, inclusive “Café com leite”. E, além disso, a experiência que teve dentro das escolas e o contato com as crianças. “Em 2019, me surgiu o conflito da peça, de pensar ‘e se a criança gostasse de ser café com leite?'” Ou seja: e se a personagem fizesse tudo de uma forma “mais ou menos” – que é justamente o que Aninha faz. A menina, cheia de tarefas, que mal dá para brincar nos momentos livres, dedica-se a ser café com leite em tudo.
‘Um teatro acessível’
Entre a ideia e a execução da peça, Rafael se viu ainda mais imerso nesse mundo da pedagogia, o que fez com que o texto fosse deixado de lado, ao mesmo tempo que despertou o desejo que, finalmente, concretizar a ideia. “O universo da criança ficou muito latente para mim e eu tentei retomar de alguma forma, revi meu trabalho, porque eu achei importante fazer um teatro acessível. Porque fala que é para a criança, mas tem toda uma gama de preconceito envolta. Pensa-se que é só da criança. Mas eu pensando que é só uma forma de fazer democrática. Eu tenho que fazer também para a criança. Porque é claro que o adulto está lá e ele também tem que gostar. Então, é um trabalho difícil, com dois públicos-alvo.”
Em 2022, Rafael se voltou ao texto e em 2023 ela estreou. O que aguçou tudo isso foi a realidade que viu, sobretudo depois da pandemia, em que percebeu um afastamento das crianças com o próprio espaço teatral. “Vi que elas estavam carentes, precisando de um trabalho, e vi que precisava concretizar”, afirma. Várias coisas de sua própria vida foram aprofundadas no texto por episódios que viveu nesse tempo. “Eu aprofundei a relação da menina com a mãe. Essa relação ficou forte e eu queria falar desse assunto de alguma forma. E trazer de alguma maneira, junto com outros códigos de infância que são da minha também, do café com leite, de se incomodar ou não.”
Peça conta a história de uma menina que, cheia de tarefas, decide ser “café com leite” em todas (Foto: Divulgação)
Uma peça para crianças e adultos
Rafael queria ainda que essa peça tivesse o mesmo efeito que o que viveu quando teve contato com o teatro. E muito disso é pensar quais sãos as referências das obras e o que se coloca em jogo para a criança no enredo. O dramaturgo conta que se questiona dessa “fórmula” de peça infantil, geralmente pautadas na fábula e na moral. “Em ‘Café com leite’ eu quis fugir da moral e trazer o aprendizado, porque ele é interno. Não é a culpa, mas a responsabilidade, o observar o outro, pensar que as crianças precisam observar outras infâncias. Tinham alguns horizontes que eu quis alcançar, mas sempre com essa discussão como norte: a gente precisa pensar na criança de hoje. Então, eu acho que eu tentei fazer um teatro contemporâneo.”
E é exatamente por isso que os adultos têm gostado também de ‘Café com leite’. Ele conta que há ainda quem pense que não se trata de uma peça infantil. “Mas não porque a criança não se divertiu, mas porque os adultos se vêem tocados de alguma maneira. Toda obra que a gente vai ver a gente vai entender alguma coisa dependendo da faixa da vida que a gente está, os interesses que a gente tem. Tem a camada do adulto e da criança. E acho que os adultos perguntam se é para criança muito porque eles já têm uma ideia pré-definida sobre o que é uma obra para criança”, acredita Rafael.
O contato que a peça teve com as crianças nesse tempo em que foi apresentada fez com que ela fosse sendo mudada, percebendo os momentos em que elas mais se divertiam, por exemplo. Agora, a peça tem mais um número musical, apesar de não ser, necessariamente, um teatro musical. Ou seja: ela se transformou, e o Rafael garante que vem já assistiu, vai encontrar novos episódios e uma cara nova.
‘Café com leite’ no Festival de Curitiba
Sobre o Festival de Curitiba, Rafael conta que eles se juntaram a outras duas companhias, uma de São João del-Rei e outra de Belo Horizonte, com o intuito de propor a Mostra Minas, e apresentar peças que falem sobre o teatro mineiro. “E o teatro mineiro é diverso. A gente leva uma peça de teatro e dança, outra de drama e a nossa que é para a infância. Ou seja: mostra a diversidade que Minas Gerais tem no teatro.” É também mostrar o que está sendo produzido em Juiz de Fora, uma cidade que tem essa arte tão presente. “E uma responsabilidade ir. A gente quer fazer o nosso melhor. Não que o tipo de trabalho represente Juiz de Fora como um todo, porque aqui também o trabalho é diverso. A gente quer ir com qualidade e energia”, finaliza.
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