Votação do PL do Aborto deve ficar para o segundo semestre; deputados consideram abrandar o texto
Apesar da confiança na aprovação do texto na Câmara, bancada evangélica avalia que é preciso esperar o debate sobre o tema esfriar
BRASÍLIA - Mesmo confiantes de que o PL do Aborto tem votos suficientes para ser aprovado na Câmara dos Deputados, parlamentares da bancada evangélica avaliam que é preciso esperar o debate sobre o tema — nas ruas e nas redes sociais — esfriar antes de avançar com a matéria na Casa. Além disso, estão considerando "abrandar" o texto.
A proposta ganhou repercussão na última quarta-feira (12), quando o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), fez uma manobra regimental que foi aprovada simbolicamente em apenas 24 segundos, conferindo urgência ao texto. Com isso, a proposição não precisará passar por nenhuma comissão temática e será avaliada diretamente pelo plenário.
O projeto de lei (1904/24) equipara ao crime de homicídio simples a realização do aborto após a 22ª semana de gestação, mesmo em situações previstas por lei. Atualmente, o aborto é permitido no Brasil em três situações: gravidez resultante de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto. A principal polêmica diz respeito à severidade da pena.
Segundo a proposição, mesmo nos casos autorizados por lei, se o aborto for realizado após a 22ª semana de gestação, a mulher poderá ser acusada de homicídio simples, com pena de 6 a 20 anos. Essa punição é mais dura do que a destinada a estupradores, que varia de 6 a 10 anos para vítimas adultas e de 8 a 12 anos para vítimas menores de idade.
Internamente, os deputados consideram abrandar esse trecho para evitar a impressão de que estupradores estão sendo tratados com impunidade. Uma mudança no Código Penal para aumentar a pena por violência sexual foi mencionada como uma possibilidade, mas os parlamentares avaliam que essas alterações seriam mais difíceis de implementar.
Por outro lado, como mostrou O TEMPO, membros da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) analisam que, independentemente da mudança, o texto contará com o apoio de pelo menos 300 votos na Câmara. O cálculo político agora é esperar o melhor momento para que a proposta seja colocada em votação.
A avaliação é de que a repercussão negativa já era esperada e, com isso, o projeto pode ficar engavetado até o segundo semestre. No entanto, esses parlamentares acreditam que a postura permanece "fiel" ao eleitorado, especialmente em ano de eleições municipais, quando muitos elegem aliados para cargos de prefeitos e vereadores.
Além disso, eles confiam que o presidente Lira cumprirá o acordo estabelecido com a Frente Parlamentar Evangélica (FPE). O acordo envolve dois momentos: primeiro, quando Lira foi reeleito presidente da Câmara em fevereiro de 2023, prometendo pautar o tema em troca de votos.
O segundo mira sua sucessão em fevereiro de 2025, onde o preferido, até então, é Elmar Nascimento (União Brasil-BA). A bancada é expressiva, contando com 205 dos 513 deputados, e pode ser crucial para a eleição de quem irá receber a “benção” de Lira.
Os parlamentares da FPE também sabem que, diferentemente da Câmara, não há espaço para o texto avançar tão cedo no Senado. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já indicou que o tema será tratado com “cautela” se aprovado pelos deputados federais.
O mesmo cálculo se aplica à posição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que indicou vetar o texto se aprovado no Congresso. No entanto, para aqueles de olho nas eleições deste ano, isso pouco importa. No entendimento deles, a bancada já conseguiu mostrar aos eleitores que está empenhada em atender suas demandas, apesar “da resistência dos esquerdistas".
Nesse "jogo de xadrez", mencionado por um dos líderes, fica claro que, mesmo se a proposta não for aprovada ou ficar fora da pauta, os parlamentares já se consideram vencedores: a proposição fortalece sua narrativa em um ano eleitoral e lhes concede mais espaço nas negociações na Câmara, onde o "Centrão" atualmente detém o poder.
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