Internado, Papa Francisco completa 12 anos à frente da igreja católica; relembre principais feitos

O argentino Jorge Mario Bergoglio está hospitalizado há quase um mês; pontificado é marcado por acolhimento às populações mais vulneráveis
O Tempo Por AFP
O papa Francisco, de 88 anos e hospitalizado há quase quatro semanas em Roma, completa nesta quinta-feira (13) 12 anos de pontificado. O marco é celebrado em momento de incógnita sobre o futuro do pontífice no Vaticano.
A dúvida é de quando Francisco sairá do Hospital Gemelli de Roma e em quais condições de saúde para manter a missão junto aos católicos. As indefinições aumentam à medida que a hospitalização do jesuíta argentino se prolonga.
O estado de saúde deixou de ser considerado "crítico", mas o bispo de Roma ainda precisa de assistência respiratória, com uma cânula nasal durante o dia e e uma máscara à noite.
O prognóstico deixou de ser reservado na segunda-feira e uma radiografia do tórax, realizada na terça-feira, confirmou "as melhoras registradas nos dias anteriores", segundo o boletim médico mais recente, publicado na quarta-feira.
Nesta quinta-feira, o Vaticano informou novamente que o pontífice passou "uma noite tranquila". A hospitalização é a quarta e mais longa desde sua eleição em 13 de março de 2013. A internação representa uma interrupção considerável ao ritmo frenético que havia marcado seu pontificado até então, apesar das recomendações para uma diminuição das atividades.
Segundo os médicos, são necessárias duas semanas para a recuperação, mas sem dúvida um período maior para Francisco, que teve parte de um pulmão removido aos 21 anos e sofreu outros problemas de saúde nos últimos anos.
Incógnita
"O restante do pontificado continua sendo uma incógnita no momento, inclusive para o próprio Francisco", declarou à AFP o padre Michel Kubler, ex-chefe de redação do jornal católico francês La Croix.
Segundo Kubler, o primeiro papa latino-americano "não sabe como será sua vida quando retornar ao Vaticano e, sem dúvida, se reserva a possibilidade de renunciar caso não consiga mais".
A recente convocação de um consistório de cardeais reacendeu as especulações, em particular quando este foi o formato escolhido por seu antecessor, Bento XVI, para anunciar sua renúncia inesperada.
Mas Francisco não estabeleceu uma data e, nos últimos meses, rejeitou a ideia de deixar a cátedra de São Pedro, por considerar que isto não deve virar "moda".
Durante sua ausência, ele delegou as missas a dirigentes da Santa Sé, mas prosseguiu com algumas atividades profissionais, como assinar documentos ou receber seus colaboradores mais próximos.
Contudo, desde sua hospitalização ele não aparece em público e o Vaticano não divulgou fotos de Francisco, em um período repleto de eventos do Jubileu, o "ano santo" católico durante o qual o Vaticano espera receber 30 milhões de peregrinos.
Com a aproximação da Semana Santa e da Páscoa, o período mais importante para os católicos, é difícil imaginar que o papa retome o ritmo de atividades de antes da internação.
"É o fim do pontificado como o conhecemos até agora, com seu ritmo frenético de audiências, viagens ao exterior e múltiplos compromissos", sentencia Michel Kubler. Veja, abaixo, alguns dos principais feitos que marcaram, até então, o pontificado.
Luta contra a pedofilia na Igreja
A multiplicação dos escândalos de agressões sexuais contra menores dentro da Igreja, desde a Irlanda até a Alemanha, passando pelos Estados Unidos e Chile, tem sido um de seus desafios mais difíceis.
Após uma polêmica viagem ao Chile em 2018, que resultou em uma série de renúncias e expulsões de destaque, o papa argentino pediu desculpas publicamente por ter defendido erroneamente um bispo.
Em 2019, expulsou o cardeal americano Theodore McCarrick, declarado culpado por abuso sexual de menores. Um gesto significativo que colocou em prática a política de "tolerância zero".
Nesse mesmo ano, uma cúpula sem precedentes sobre a proteção de menores, realizada no Vaticano, levou a uma série de medidas concretas, como a eliminação do segredo pontifício sobre esses crimes, a obrigatoriedade para religiosos e leigos de denunciar qualquer caso à hierarquia e a criação de plataformas de escuta em dioceses ao redor do mundo, entre outras.
No entanto, o segredo da confissão continuou sendo inquebrantável.
Diplomacia e "periferias"
Em suas 47 viagens ao exterior, Jorge Mario Bergoglio priorizou a visita às "periferias" do mundo, especialmente em países marginalizados do Leste Europeu, América Latina e África.
O primeiro papa latino-americano é um grande defensor do multilateralismo e denuncia incessantemente a guerra e o comércio de armas.
Além disso, defende o diálogo com todas as religiões, especialmente com o Islã, como demonstrou em uma visita histórica ao Iraque em 2021.
Também conseguiu um acordo inédito com o regime comunista da China, em 2018, sobre a delicada questão da nomeação de bispos.
A diplomacia da Santa Sé também trabalhou para a reaproximação histórica entre Cuba e os Estados Unidos em 2014 e apoiou o processo de paz na Colômbia.
A Igreja de Francisco também se envolveu em vários conflitos regionais na América Latina e na África. No entanto, no caso da guerra na Ucrânia, iniciada com a invasão russa em fevereiro de 2022, não conseguiu se impor.
Esse conflito também interrompeu a gradual reaproximação com o patriarca ortodoxo russo Cirilo, com quem conseguiu um encontro histórico em 2016, o primeiro entre os líderes das Igrejas do Oriente e do Ocidente desde o cisma de 1054.
Migrações, meio ambiente e comunidade LGBTQIAPN+
Francisco defende uma Igreja aberta a "todos" e tem multiplicado os gestos em favor de divorciados recasados e fiéis LGBTQIAPN+.
No final de 2023, autorizou a bênção de casais do mesmo sexo, uma decisão que gerou rejeição em setores conservadores da África e dos Estados Unidos.
Da ilha italiana de Lampedusa ao campo de refugiados grego de Lesbos, o pontífice argentino defendeu os migrantes e pediu que sejam acolhidos sem distinção, pois fogem da guerra e da miséria.
Dias antes de sua hospitalização em fevereiro, o papa disse que as deportações de migrantes irregulares nos Estados Unidos de Donald Trump "feriam a dignidade" das pessoas.
Em sua encíclica "Laudato Si" (2015), clamou por uma "revolução verde" e criticou o "uso irresponsável dos bens que Deus colocou" à disposição na Terra, defendendo a "ecologia integral".
Em 2020, escreveu uma exortação em defesa da Amazônia, após consultar no Vaticano todos os líderes religiosos e indígenas desse vasto território, introduzindo o que chamou de "pecado ecológico".
Reformas
O papa Francisco buscou implementar uma reforma profunda da Cúria Romana — o governo central da Igreja — para fortalecer o processo de escuta das igrejas locais e dar mais espaço aos leigos e às mulheres.
Essas reformas, algumas criticadas internamente, foram concretizadas com a entrada em vigor, em 2022, de uma nova Constituição, que reorganizou os dicastérios (ou ministérios) e deu prioridade à evangelização.
Francisco também renovou o obscuro setor das finanças do Vaticano, envolvido em escândalos, com a criação, em 2014, de um Secretariado para a Economia.
Foi estabelecido um marco para investimentos, implementadas medidas anticorrupção e ordenado o saneamento do Banco do Vaticano, com o fechamento de 5 mil contas.
Ele também revolucionou o Sínodo, uma reunião mundial de bispos, ao incluir pela primeira vez mulheres e leigos. Mas essas reformas lhe renderam críticas sem precedentes dentro da Igreja, especialmente quando restringiu o uso da missa em latim em 2021, irritando o setor mais tradicionalista.
Reformas inacabadas
A principal questão que se apresenta é se a Santa Sé prosseguirá com as reformas empreendidas nos últimos 12 anos pelo papa argentino. Com sua aposta pela proximidade, o pontífice estabeleceu uma mudança de estilo no Vaticano. Suas reformas também modificaram profundamente a vida da Igreja.
Colocar as finanças em ordem, dar espaço aos laicos e às mulheres, descentralizar, abrir as portas aos divorciados que se casaram novamente e aos fiéis LGBT ou lutar contra as agressões sexuais foram algumas de suas decisões.
A política de Francisco rendeu uma ferrenha oposição interna, que se acentuou nos últimos anos. Seu aval à bênção de casais do mesmo sexo no final de 2023 provocou, por exemplo, um forte protesto na África.
"Gostemos ou não, ele mudou as coisas, mas muitas continuam pendentes", disse uma fonte vaticana, que pediu anonimato. Seu projeto mais recente, o sínodo sobre o futuro da Igreja, mudou as regras do jogo. Pela primeira vez, o papa convidou laicos e mulheres para esta grande reunião mundial de bispos.
Mas a questão da ordenação de mulheres como diaconisas ficou em suspenso e os temas mais sensíveis foram atribuídos a 10 grupos de trabalho, que deverão entregar suas conclusões em junho.
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