Lei da bengala verde ainda não beneficia pessoas com baixa visão em JF
Norma, em vigor desde 2018 no município, carece de divulgação para que seja efetiva, de acordo com o público-alvo
Por Hugo Netto Fonte Tribuna de Minas
Em uma publicação da Tribuna, sobre a sanção de uma lei que acrescentou doenças e deficiências que dão direito ao cordão de girassol, o leitor Bruno Guedes comentou que o acessório precisaria ser difundido. “Um exemplo claro: nós, deficientes visuais, temos diferenças na cor de nossas bengalas e ninguém sabe. No caso do cordão, para quem não conhece, vai ser só mais um cordão pendurado no pescoço”, escreveu.
Em Juiz de Fora, a Lei nº 13.683, de 27 de março de 2018, proposta pelo então vereador Wanderson Castelar (PT), institui o exemplo dado por Bruno, com o uso da bengala verde para pessoas diagnosticadas com baixa visão, definida no texto como “restrição de acuidade visual menor ou igual a 20/200, e/ou inferior a 30% da visão do melhor olho, ou campo visual (visão lateral) menor que 20 graus”.
A lei ainda autoriza o Executivo a estimular o uso do equipamento entre as pessoas que se enquadram e esclarecer a população sobre as diferenças entre os grupos de deficientes visuais. Porém, ao longo dos quase seis anos de vigência, Bruno afirma que nunca percebeu a disseminação, fazendo com que ele próprio não se beneficie da lei que deveria atendê-lo. “Eu não utilizo [a bengala verde] exatamente por essa falta de informação. Eu sou baixa visão, só que, para muita gente, uma bengala colorida vai ser ‘Ah, bonitinho, o ceguinho tá com a bengala colorida'”, desabafa.
Instrutor de orientação e mobilidade da Associação dos Cegos de Juiz de Fora, Julio Cezar Ferreira Elias acrescenta que o preconceito também interfere na situação: “Às vezes, independente de estar com a bengala verde ou a branca, é desrespeitado da mesma forma, então isso acaba desmotivando a pessoa com deficiência visual a usar a bengala da cor certa, conforme a classificação do grau da deficiência dela”.
Além da bengala verde, também existem as brancas ou de alumínio, para cegos totais, e brancas com ponteira vermelha, para surdos-cegos. “Também tem que ser explicado o significado dessas outras cores. [A lei] foca só na bengala verde, mas aí quando vê alguém com a bengala branca, não sabe o porquê”, lembra o instrutor.
Cores das bengalas diferenciam os graus de severidade da deficiência visual de cada indivíduo (Foto: Leonardo Costa)
Desvios no caminho
Bruno conta que um exemplo clássico de como o conhecimento sobre a bengala verde poderia ajudá-lo aconteceu no dia anterior à entrevista. “Eu enxergo pouco, de perto. Estava subindo a Floriano Peixoto, vi um cone de sinalização e desviei para o canto. Naquele canto, tinha uma escada grande. Eu vi, voltei e desviei. Muita gente pode ver a situação e pensar ‘Olha, aquele cego ali tá mentindo. Tá usando bengala e desviando das coisas’. Tendo a divulgação da bengala verde, as pessoas sabendo, evita esse tipo de problema”.
Enquanto Bruno desvia, muitas pessoas não são capazes do mesmo, algo que Julio Cezar nota quando realiza treinamentos. “As pessoas veem que eu estou com um deficiente visual, dando aula, e mesmo assim não saem do caminho. Eu tenho que desviar ou pedir para a pessoa sair.” Ele acredita que seja também por falta de conscientização, que poderia ser sanada com a propagação da informação correta, por meio de folders e palestras, por exemplo, conforme opina.
Entre R$ 80 e R$ 160
A lei municipal não determina que o instrumento seja fornecido para quem precisa, diferentemente do projeto nacional nº 4189, de 2019, que tramita no Senado atualmente. “O Sistema Único de Saúde (SUS) fornecerá a bengala longa na coloração solicitada pela pessoa que a utilizará, conforme sua percepção das barreiras que lhe dificultam a participação plena e efetiva na sociedade”, determina, além de especificar as outras cores, além da verde. O projeto de lei é de autoria do deputado federal Capitão Alberto Neto (Republicanos/AM).
Em Juiz de Fora, a Associação dos Cegos, que realiza atendimentos pelo SUS e por meios particulares, possui uma parceria com o sistema público. “Os assistidos que se encontram dentro do programa de reabilitação visual e realizam o curso de orientação e mobilidade recebem uma bengala fornecida pelo SUS, na conclusão do curso”, explica Julio Cezar, com o detalhe de que, fora deste programa, não é possível solicitar o objeto – que custa entre R$ 80 e R$ 160 reais, em média – gratuitamente, por conta própria.
A Tribuna questionou a Prefeitura de Juiz de Fora sobre a falta de divulgação sobre o tema e se existem planos para que as bengalas coloridas venham a ser fornecidas pelo Poder Público, mas não obteve resposta.
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