Jornada de pilotos e comissários pode aumentar de 12 para 14 horas por dia; sindicato questiona
Agência Nacional de Aviação Civil quer aumentar a jornada de trabalho dos tripulantes aéreos
O Tempo Por Pedro Faria
Está em discussão na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) um novo regulamento que pode aumentar a jornada dos tripulantes aéreos no Brasil. Atualmente, os funcionários do setor trabalham em jornada de 12 horas com outras 12 horas de descanso. Com o novo Regulamento Brasileiro da Aviação Civil (RBAC) 117, esse número iria subir para 14 horas.
A RBAC 117 é uma regulamentação estabelecida pela Anac que trata das regras de gerenciamento de fadiga na aviação civil. Essa regulamentação visa garantir a segurança operacional ao abordar questões relacionadas à fadiga dos tripulantes de voo, incluindo pilotos e comissários de bordo.
A proposta não foi bem recebida por representantes do setor. Henrique Hacklaender, presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA), conta que a atual legislação já não é favorável aos trabalhadores e que a nova pode piorar a situação. “Ele está gerando uma proposta de alteração de jornadas ainda maiores do que são hoje. O regulamento entrou em vigor em 2020 e, com a pandemia, ele não foi aplicado corretamente. Com o passar do tempo, os tripulantes perceberam que as jornadas estavam muito cansativas, fatigantes. Agora a Anac quer aumentar ainda mais”, afirma.
Hacklaender não nega a importância de uma mudança na regulamentação, mas que isso não traga prejuízo para os trabalhadores. “Entendemos que é necessário uma alteração no Rbac 117, mas que traga melhorias nas condições de operações dos tripulantes. O Rbac atual é ineficaz, fica claro que ele também não atende o objetivo. Se a gente fosse propor uma mudança, seria uma melhora para o gerenciamento da fadiga, não aumentar as jornadas”, conta o presidente.
Além de aumentar a jornada de trabalho, o novo regulamento não garante a exatidão das horas descansadas. As 12 horas atualmente estabelecidas começam a contar 30 minutos após o fim da operação dentro da aeronave. O traslado do aeroporto até o hotel e outros problemas que podem surgir não são adicionados no horário.
Ainda de acordo com ele, a Anac está baseando o projeto atual no modelo americano, o que, na visão dele, não é possível ser feito caso comparamos as infraestruturas aéreas dos dois países. “Ela está se baseando muito na regulação americana e europeia. Ela se compara muito com outras agências. Eles utilizam a frase “quer harmonizar com as regulações internacionais”. Quando se fala de gerenciamento de fadiga e segurança de voo, temos que levar em consideração os diversos fatores, como a infraestrutura, segurança aérea. Os países têm suas diferenças. Não tem como gerenciar replicando o modelo americano, não temos rede de hotéis ou aeroportos igual lá. Não poderia simplesmente utilizar o regulamento americano como cópia”,
explica.
Na última sexta-feira (28), a Anac recebeu representantes do setor para discutir o tema em uma audiência pública. Os participantes questionaram a falta de embasamento científico nas novas propostas.
Amanhã (3), será feita uma nova audiência pública, desta vez na Câmara dos Deputados, a pedido do deputado Alfredinho (PT-SP). Em sua justificativa para a solicitação da audiência, Alfredinho mencionou a pesquisa realizada pelo SNA, que mediu a percepção dos níveis de fadiga dos aeronautas. Realizada em 2023, mais de 4.300 pessoas responderam sobre a percepção de fadiga. “O que ficou claro é que elas não confiam no sistema, um sistema falho e em muitos casos os tripulantes acabam caindo no sono durante suas jornadas”, explicou o presidente do sindicato.
Atualmente, o documento está disponível para uma consulta pública, onde qualquer pessoa pode colocar seu parecer sobre o tema. Ele ficará disponível até o dia 12 de agosto, quando a Anac pretende recolher as novas sugestões e finalizar o texto.
Em nota, a Anac informou que "atualização do regulamento pretende revisar critérios para o gerenciamento da fadiga nas tripulações das operações regidas pelo RBAC nº 121, obedecendo a legislação em vigor, sem descuidar da segurança dessas operações".
Já a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) disse que "as empresas aéreas associadas à ABEAR já possuem um processo consolidado de gerenciamento da fadiga, similar aos aplicados pelos maiores operadores aéreos que compõem o grupo de excelência da aviação mundial."
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