Obra irregular causa transtorno no Francisco Bernardino
Apesar de proprietário de terreno ter sido autuados, problemas e impactos para os moradores continuam
Tribuna Por Pâmela Costa
Há pelo menos dois anos, os moradores da Avenida Vereador Raimundo Hargreaves, do Bairro Francisco Bernardino, próximo ao condomínio Pedra Bonita, na Zona Norte de Juiz de Fora, sofrem as consequências de construções irregulares. Ainda em 2022, o proprietário do terreno chegou a ser multado em quase R$ 170 mil, conforme mostrou matéria da Tribuna à época, mas ainda é a população que tem pagado o preço pelas obras ilegais, que continuam gerando impacto desde então.
Em período de chuva, o transtorno ganha tom de preocupação – a passagem para sair de casa é obstruída e a lama toma a rua. A situação que vem se perpetuando fez com que a advogada Lorena Campos procurasse o proprietário do terreno. Ela, entretanto, alega que não foi ouvida. “A partir daí, venho fazendo denúncias. Já foram quatro denúncias formais no site da prefeitura de Juiz de Fora (PJF).” Mas o caso permanece o mesmo.
A primeira denúncia foi feita em 25 de fevereiro de 2022 e, conforme ela conta, o homem chegou a ser multado e obrigado a fazer o calçamento do morro, para que o deslizamento de terra fosse freado. “Além da obra que está ilegal, o dono também tirou a terra do terreno e aterrou o lote da frente, próximo a um córrego, o que acarretou em mais multa para ele, pelo crime ambiental”, afirma Lorena.
À época do fato, a Tribuna noticiou que a pilha de descartes jogados no local atingia cerca de 20 metros de altura. Como consequência, a mata ciliar foi suprimida a quase 2,5 mil metros quadrados. Os materiais estavam a uma distância inferior a 30 metros da borda da calha do leito de curso de água existente no local, o que também foi contabilizado na multa.
No dia 5 de outubro de 2022, outra denúncia foi feita por Lorena, em vista da inércia quanto à resolução do problema. Na data, uma chuva caiu sobre o local e a rua foi interditada. O dono do terreno começou, então, a colocar em prática a série de medidas que haviam sido estipuladas, como o calçamento.
Rampa e bueiro no meio da rua
Um ano depois, no entanto, em 21 de dezembro de 2023, outra denúncia foi feita. “O calçamento estava concluído e, para a surpresa dos moradores, a subida do loteamento está invadindo totalmente a rua e ocupando metade da pista em que passam os carros, o que está perigoso demais, podendo causar acidentes, já que a rampa do local e o bueiro estão literalmente no meio da rua”, reclama Lorena.
A última denúncia feita pela advogada, já neste ano, em 22 de fevereiro, foi em relação a uma manilha irregular que teria sido inserida pelo proprietário do terreno. Segundo ela, a lama passou a ser escoada, agora, em direção a um córrego. A manilha também acabou quebrando e o asfalto foi deteriorado. Juntas, essas denúncias expõem uma situação de risco – uma vez que, segundo Lorena, motociclistas já caíram ali e o transporte público fica com a circulação restrita.
Fernando Ramos, outro morador que reside próximo à obra, afirmou que os problemas estão localizados próximo a uma curva fechada – o que coloca condutores e pedestres sob risco. “Isso pode ocasionar uma colisão com veículo no sentido contrário”, adverte ele, que já chegou, inclusive, a abrir reclamação junto à PJF. Outro vizinho, que preferiu não ser identificado, corroborou a declaração e ressaltou a reincidência do problema.
A Tribuna entrou em contato com a Prefeitura, que não informou a situação atualizada do local até a edição desta reportagem. A PJF também não se manifestou em relação ao que pode ser feito para sanar os problemas, nem informou quantas notificações foram feitas ao proprietário das obras irregulares ou sobre a judicialização do caso. A reportagem também tentou entrar em contato com o proprietário do terreno e aguarda retorno. O espaço está aberto à manifestação.
JF tem quase 600 obras irregulares
Em matéria publicada pela Tribuna em março, o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG) informou que houve 586 obras irregulares identificadas pela Inspetoria de Juiz de Fora – que abrange 34 municípios. Isso equivale a 37% do total das 1.557 ações de fiscalização que foram exercidas.
Para a especialista em sustentabilidade na construção civil e coordenadora dos cursos de engenharias do Centro Universitário Estácio Juiz de Fora, Ana Flávia Ramos Cruz, é necessário que, desde o começo da obra, o procedimento seja aprovado – para evitar tanto as irregularidades quanto os impactos ambientais.
“A princípio, para a obra ser executada, é necessário inicialmente o desenvolvimento do projeto e aprovação deste na Prefeitura. Após aprovação, o responsável pela construção consegue o alvará de construção”, ela esclarece. O alvará de construção é emitido no portal Prefeitura Ágil, da Prefeitura, e somente com ele em mãos a obra se torna regular.
Outro passo que ela indica para se certificar da legalidade da obra são as informações técnicas. “É fundamental também que as anotações de responsabilidade técnica (de projeto e execução) sejam emitidas junto ao Crea-MG pelos profissionais responsáveis pela obra. Assim, a obra estará regular diante da Prefeitura do município e também do Conselho de Engenharia”, finaliza.
Responsabilização
As irregularidades podem ir desde a falta de licenciamento, construção em terreno irregular, obra em área de preservação ambiental ou em terreno público. Seja como for, a partir da ilegalidade da construção, o proprietário fica sujeito tanto a multa quanto a interrupção do serviço até a regularização e emissão do alvará.
Por isso Ana Flávia alerta: “antes de adquirir um terreno, é necessário que o adquirente confira junto à Prefeitura a procedência e a viabilidade de construção naquele local”, destaca. Ela também chama atenção para a responsabilização do proprietário da obra.
“Se a obra ficar um longo período parada, por exemplo, isso pode, sim, afetar a vizinhança, como temos visto na cidade. Lugares abandonados sendo foco de mosquito transmissor de doenças, questões de transtorno visual e poeira.” Contudo, segundo ela, neste caso o recomendado é tentar entrar em contato com o dono da obra, com o responsável técnico pela execução do serviço e, por fim, denunciar junto à Prefeitura e ao Crea, para que a pessoa seja autuada.
Para Lorena, o procedimento, entretanto, não tem sido eficaz ou gerado resultados. Ela afirma que a PJF emitiu um comunicado em resposta a ela, após dois anos de reclamações, afirmando que o proprietário do terreno recebeu auto de infração, auto de embargo e termo de intimação. “Estando o responsável sujeito à incidência de multa e demais sanções administrativas cabíveis”, disse texto da Prefeitura, sobre o homem que já foi multado em mais de R$ 170 mil há cerca de dois anos.
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