Categoria contesta pontos de projeto de lei para motoristas por aplicativos
Valor da tarifa base e seguridade social são as principais questões avaliadas na proposta do Governo federal
Por Sandra Zanella Tribuna de Minas
O projeto de lei (PL) que regula a atividade de motorista por aplicativos sobre quatro rodas, enviado pelo Governo federal ao Congresso Nacional na última semana, tem causado polêmica. Valor mínimo de remuneração, inclusão obrigatória na Previdência Social e negociação entre patrões e trabalhadores via acordos coletivos são alguns dos pontos principais, mas o texto ainda vai ser analisado por deputados e senadores, podendo sofrer alterações em relação ao original, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Antigo diretor da Associação de Motoristas por Aplicativos de Juiz de Fora e Zona da Mata (AMA JF-ZM) e atual diretor financeiro da Federação dos Motoristas por Aplicativos do Brasil (Fembrapp), Sóstenes Josué avalia que ele mesmo esteve muito envolvido nesse projeto. “No ano passado estive duas vezes em Brasília.” Segundo ele, é provável que ocorra alguma manifestação nacional para contestar algumas questões que não foram de encontro aos interesses da categoria.
De acordo com a Agência Brasil, a lei deve impactar, pelo menos, 704 mil motoristas por aplicativos, segundo o último levantamento sobre a categoria feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na proposta do Executivo, está prevista a obrigação de as empresas informarem aos trabalhadores sobre os critérios para a oferta de viagens, pontuação, bloqueio, suspensão e exclusão da plataforma “em linguagem clara e de simples entendimento”.
As empresas também serão obrigadas a detalhar os critérios relacionados ao valor da remuneração do condutor, com o preço médio da hora trabalhada e sua comparação com a quantia mínima estabelecida na norma. O texto limita as possibilidades de exclusão dos motoristas em hipóteses de “fraudes, abusos ou mau uso da plataforma”, garantindo direito de defesa. Nas condições atuais, os trabalhadores não sabem quais são os critérios usados para a própria avaliação, nem como é definido o pagamento pelo trabalho. “Eles estão submetidos, ainda, a uma avaliação rígida, sem direito a interferir nos critérios e sem direito a contestação”, informa o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), por meio da Agência Brasil.
Tarifa mínima é crucial para os motoristas
Segundo o diretor financeiro da Fembrapp, Sóstenes Josué, a tarifa mínima é a principal questão, seguida pelo respeito por parte das plataformas, para evitar a exclusão de trabalhadores sem qualquer justificativa e sem direito de defesa, além da seguridade social. “Esses três pontos já estavam mais ou menos criados e formatados. Era só fazer ajustes, para que as coisas continuassem andando.” No entanto, isso não foi o que aconteceu, na opinião da categoria. “Na boa parte das corridas por aplicativo, o motorista ganha por quilômetro rodado, tempo e tarifa base. Essa composição é ideal”, aponta.
Conforme Sóstenes, além disso, deveria constar na proposta um indexador para essa tarifa base, para que todo ano o valor fosse reajustado. “Mas o que aconteceu? Colocaram R$ 32,90 a hora. Só para ter ideia, hoje, em dias ruins, o motorista já ganha R$ 35 a hora. O teto está abaixo do que o motorista já ganha hoje. Então não houve benefício algum sobre aquilo que era o grande problema.”
Em relação ao respeito das plataformas pelos condutores, o representante da categoria avalia que há melhora no projeto, mas ainda não suficiente. “O motorista tem algumas garantias em relação à plataforma para não ser excluído, mas ainda não é da forma que deveria ser.” Já a seguridade social, Sóstenes pontua que já era prevista através do MEI (microempreendedor individual). “O que precisamos é simplificar um pouco mais o MEI, melhorar a realidade para o motorista de aplicativo, para que ele se sinta um pouco mais abraçado. Mas colocaram imposto (para a Previdência Social). Está indicando na proposta que o condutor vai tributar 7,5%, e a plataforma 20% sobre o bruto, não sobre o que ele ganha (líquido).”
Com isso, ele acredita que as empresas ainda vão querer aumentar o valor das corridas, para tirar a diferença do imposto. “De onde a plataforma vai querer tirar esses 20%? Vai ser um pouco em cima do motorista e do passageiro. As corridas vão aumentar, o trabalhador vai continuar ganhando menos, e a plataforma vai pagar mais imposto para o Governo. Então, a meu ver, a proposta está toda errada.”
Acordos coletivos e jornada de 8 horas
Os acordos coletivos devem direcionar as negociações entre plataformas e motoristas, conforme o projeto de lei, incluindo questões como plano de saúde, seguro de vida e horas extras. Dessa forma, os trabalhadores deverão ser representados por sindicatos devidamente registrados.
Sobre a remuneração questionada pela categoria, a proposta estabelece um valor mínimo a ser pago por hora trabalhada de R$ 32,90, sendo R$ 24,07 para cobrir os custos do trabalho (gasolina, internet e manutenção do veículo), com caráter indenizatório, e R$ 8,03 de remuneração efetiva para o trabalhador.
A jornada estimada será de oito horas diárias ou 176 horas mensais, podendo chegar ao máximo de 12 horas diárias. “Caso o motorista trabalhe 43 horas por semana, ele receberá, no mínimo, o valor atual do salário mínimo, de R$ 1.412, excluído os custos para manutenção do trabalho”, observa a Agência Brasil. Além disso, as empresas ficam proibidas de limitarem “a distribuição de viagens quando o trabalhador atingir a remuneração horária mínima”. O reajuste seguiria as mesmas regras do salário mínimo.
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