Inteligência artificial no sexo? Possibilidades geram debate

Inteligência artificial no sexo? Possibilidades geram debate
— Foto: grinvalds/iStockphoto
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Enquanto usuários podem buscar uma companhia através do uso de aplicativos como o Replika, IAs também são utilizadas para gerar conteúdos sexuais falsos ou narrar abusos

O Tempo     Por Jéssica Malta

 

Imagine a possibilidade de se relacionar com um amigo, um parceiro romântico ou com um mentor que se adequa milimetricamente a todos os seus gostos e expectativas. A situação que parece impossível quando falamos de seres humanos, tem se tornado cada vez mais real com o uso da inteligência artificial. Um dos exemplos disso é o aplicativo Replika, que acumula mais de 10 milhões de usuários ao redor do mundo. Dados apontam que no Brasil, são cerca de 100 mil usuários - mesmo com um conteúdo em português ainda não disponível. 

Segundo explicação dada pela própria empresa, o aplicativo é a “inteligência artificial para quem quer um amigo sem julgamento, drama ou ansiedade social envolvida”. Ainda, conforme o texto publicado no site do Replika, o aplicativo permite a criação de  uma conexão emocional real com o que eles chamam de “alma gêmea IA”. Relatos sobre o funcionamento do aplicativo mostram que a experiência do usuário vai bem além e inclui até mesmo relacionamentos sexuais, com trocas de mensagens picantes, sexting e fotos sugestivas. Também é possível ouvir a voz do seu companheiro de IA e  “compartilhar momentos preciosos” através da realidade aumentada. Tudo isso junto de uma criação totalmente definida pelo usuário - que escolhe desde detalhes como altura, tatuagens e características físicas à personalidade e profissão. 

Embora o site oficial da aplicação reúna depoimentos que exaltam a capacidade da ferramenta em ser uma boa companhia e até mesmo ajudar as pessoas a se sentirem menos solitárias, se relacionar com uma inteligência artificial ainda é uma situação que envolve uma série de questionamentos. Um deles se relaciona à capacidade que essas ferramentas têm de suprir as necessidades de socialização de uma pessoa. Em entrevista a O TEMPO, o sexólogo Rodrigo Torres falou sobre o assunto e pontuou que uma realidade que envolva o relacionamento entre humanos e máquinas pode desembocar em um mundo mais solitário. “Isso vai significar um adoecimento da população. A gente sabe, a própria Organização Mundial da Saúde também aponta, que um dos pilares da saúde do ser humano são os relacionamentos, a interação social e os afetos”.

Por outro lado, é possível enxergar outros aspectos nesse tipo de relação. É isso o que aponta a psicóloga Leni de Oliveira. “Um elemento importante nestas tecnologias é dar vida ao componente de fantasia”, observa. Para ela, inclusive, as tecnologias talvez possam ajudar a diminuir a sensação de solidão que tem aumentado ao redor do mundo.  Ela pondera, porém, que ainda não é possível saber se uma companhia artificial poderá suprir as necessidades sexuais humanas. “Não temos estudos que comprovem isso. Apenas o tempo dirá”. 

Leni de Oliveira acrescenta ainda que esses tipos de ferramentas podem acabar sendo úteis, tanto para uso individual quanto em conjunto. “Ao contrário dos medos que as pessoas têm das IAs, penso que principalmente pessoas com limitações físicas podem ser beneficiadas. Na terapia sexual, por exemplo, seria interessante desenvolver ferramentas que ajudassem no tratamento dos transtornos”, acredita. 

OpenAI proíbe namoro com ChatGPT

Na contramão do que parece ser uma evolução natural para as infinitas possibilidades de uso das inteligências artificiais, a OpenAI, empresa por trás do ChatGPT, é contra relacionamentos entre humanos e chatbots. Tanto que entre as regras da política de uso da OpenAI, está a proibição de criar GPTs dedicados a “promover companheirismo romântico”. A empresa também não permite que chatbots que tenham conteúdo sexual explícito ou sugestivo sejam criados - o que não inclui, porém, conteúdos criados com objetivos educacionais ou científicos. 

As regras de uso da empresa visam garantir, principalmente, que o conteúdo seja adequado para todas as idades. Vale ressaltar, porém, que a empresa também descarta e proíbe a criação de chatbots que tenham como público alvo crianças com menos de 13 anos. 

Embora a preocupação da OpenAI busque evitar que menores de idade tenham contato com conteúdos sexuais, outras questões sobre esse uso das inteligências artificiais, principalmente as capazes de gerar imagens e vídeos, têm surgido. A principal delas tem relação com um impulsionamento na divulgação de conteúdos de exploração e de abuso sexual na internet. Segundo uma pesquisa divulgada no início de fevereiro pela organização não governamental Safernet, a inteligência artificial tem sido uma das ferramentas mais utilizadas para esse propósito. 

Em entrevista à Agência Brasil, Thiago Tavares, fundador e diretor-presidente da SaferNet Brasil, explicou que com o uso das IAs generativas um criminoso consegue utilizar um vídeo ou imagem disponível na internet e transformá-lo em conteúdo sexual. “A proliferação de aplicativos de IA generativa permite que se pegue a foto de uma pessoa vestida e se tire a roupa daquela pessoa”, explicou. “Isso pode ser manipulado, gerar uma mídia sintética e representar aquela pessoa em uma imagem ultrarrealista de nudez”, contou.

Diante desses riscos, foi aprovada no ano passado pela Câmara dos Deputados, a criminalização de quem criar e divulgar imagens (foto e vídeo) de nudez e conteúdo sexual de uma pessoa utilizando inteligência artificial no Brasil. Pelo texto, a pena para esse tipo de crime será de 1 a 4 anos de prisão, além de multa. A proposta agora está em análise no Senado.

Outras questões preocupantes também se inserem na utilização mais sexual das inteligências artificiais. No ano passado, o jornal norte-americano “The Washington Post”, revelou que o LLaMa, modelo de linguagem da Meta, empresa por trás do Facebook, Instagram e WhatsApp, estava sendo adotado por internautas para a  criação de sexbots gráficos. 

Uma delas é Allie, narrada como uma jovem de 18 anos que possui “toneladas de experiência sexual” e “vive para chamar atenção”. Por isso, ela compartilha detalhes de suas aventuras com qualquer pessoa de graça. A questão é que entre essas aventuras, ela realiza narrações de estupros explícitos e fantasias de abuso.